O Sistema Único de Saúde (SUS) pode ser judicialmente obrigado a custear medicamentos, tratamentos e outros procedimentos de saúde, mas essa obrigação é excepcional e depende do preenchimento de requisitos cumulativos definidos pela jurisprudência, especialmente pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) e pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Seguem os critérios detalhados com base nos entendimentos mais recentes dos tribunais superiores.

Requisitos Gerais para Fornecimento pelo SUS

A obrigação do Estado de fornecer tratamentos não incorporados em seus atos normativos foi consolidada pelo STJ no julgamento do Tema 106, que estabeleceu as condições essenciais para a concessão. Posteriormente, o STF, no Tema 6, refinou e detalhou esses critérios.

1. Posição do STJ (Tema 106)

O STJ, no julgamento do REsp 1.657.156/RJ, definiu que a concessão de medicamentos não incorporados pelo SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos:

  • Imprescindibilidade do Tratamento: Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado, de que o medicamento ou tratamento é indispensável e que as alternativas terapêuticas fornecidas pelo SUS são ineficazes para o caso específico do paciente.
  • Incapacidade Financeira: Prova de que o paciente não possui condições financeiras de arcar com o custo do tratamento prescrito.
  • Registro na ANVISA: Existência de registro do medicamento na Agência Nacional de Vigilância Sanitária.

STJ — REsp 1657156 — Publicado em 04/05/2018

A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: (i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; (ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito; (iii) existência de registro na ANVISA do medicamento.

2. Posição do STF (Tema 6 e Tema 1234)

O STF, ao julgar o RE 566.471/RN (Tema 6), também tratou da matéria, estabelecendo parâmetros ainda mais detalhados e reforçando a excepcionalidade da intervenção judicial. Os requisitos são:

  • Negativa Administrativa: Comprovação de que houve um pedido e uma recusa de fornecimento do medicamento na via administrativa.
  • Ilegalidade na Não Incorporação: Demonstração de ilegalidade no ato que deixou de incorporar o medicamento, ausência de pedido de incorporação pela CONITEC ou mora na sua apreciação.
  • Impossibilidade de Substituição: Inexistência de medicamento ou tratamento similar ou substituto nas listas do SUS.
  • Comprovação Científica: A eficácia, segurança e efetividade do tratamento devem ser comprovadas com base em evidências científicas de alto nível (ensaios clínicos randomizados, revisões sistemáticas, etc.).
  • Imprescindibilidade Clínica: Laudo médico fundamentado que ateste a necessidade do tratamento.
  • Incapacidade Financeira: Incapacidade do paciente de custear o tratamento.

STF — RE 566471 — Publicado em 28/11/2024

É possível, excepcionalmente, a concessão judicial de medicamento registrado na ANVISA, mas não incorporado às listas de dispensação do Sistema Único de Saúde, desde que preenchidos, cumulativamente, os seguintes requisitos, cujo ônus probatório incumbe ao autor da ação: (a) negativa de fornecimento do medicamento na via administrativa; (b) ilegalidade do ato de não incorporação do medicamento pela Conitec; (c) impossibilidade de substituição por outro medicamento constante das listas do SUS; (d) comprovação, à luz da medicina baseada em evidências, da eficácia, acurácia, efetividade e segurança do fármaco; (e) imprescindibilidade clínica do tratamento; e (f) incapacidade financeira de arcar com o custeio do medicamento.

Responsabilidade Solidária dos Entes Federativos

Um ponto fundamental é a responsabilidade solidária entre União, Estados e Municípios. Conforme o Tema 793 do STF, o cidadão pode acionar qualquer um dos entes federativos, isolada ou conjuntamente, para garantir seu direito à saúde.

  • STF — Tema 793 (RE 855.178): O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, sendo responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles.
  • STJ — Jurisprudência Consolidada: O STJ segue o mesmo entendimento, afirmando que não há litisconsórcio passivo necessário, cabendo ao cidadão escolher contra quem irá demandar, especialmente quando o medicamento possui registro na ANVISA.

STJ — AgInt no AREsp 2211791 — Publicado em 15/06/2023

O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente.

STF — RE 1338906 — Publicado em 03/03/2022

O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, no julgamento do RE 855.178- RG (Rel. Min. LUIZ FUX, Tema 793), examinou a repercussão geral da questão constitucional debatida nestes autos e reafirmou a jurisprudência desta CORTE no sentido da responsabilidade solidária dos entes federados quanto ao dever de prestar assistência à saúde.

Casos Excepcionais: Medicamentos sem Registro na ANVISA

A regra geral é a impossibilidade de o Estado ser obrigado a fornecer medicamentos sem registro na ANVISA. Contudo, o STF (Tema 1.161) abriu uma exceção para casos em que, embora sem registro, o medicamento tenha sua importação autorizada pela ANVISA, como ocorre com alguns derivados de Canabidiol.

STF — Rcl 60998 — Publicado em 04/06/2024

Cabe ao Estado fornecer, em termos excepcionais, medicamento que, embora não possua registro na ANVISA, tem a sua importação autorizada pela agência de vigilância sanitária, desde que comprovada a incapacidade econômica do paciente, a imprescindibilidade clínica do tratamento, e a impossibilidade de substituição por outro similar constante das listas oficiais.

Desta forma, a obrigação judicial do SUS de custear tratamentos não incorporados em seus atos normativos é uma medida excepcional que exige uma robusta comprovação dos requisitos estabelecidos pelos tribunais superiores, centrados na demonstração da necessidade do tratamento, na falha das políticas públicas existentes e na incapacidade financeira do paciente.

Se você ou um familiar teve tratamento ou medicamento negado pelo SUS ou plano de saúde, não enfrente isso sozinho. Cada caso tem particularidades que podem mudar completamente o resultado na Justiça.

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