A recusa de um plano de saúde em autorizar uma internação de urgência pode ser considerada abusiva, conforme a legislação brasileira e a jurisprudência dos tribunais.
A Lei nº 9.656/1998 (Lei dos Planos de Saúde), em seu artigo 35-C, estabelece que é obrigatória a cobertura de atendimentos de urgência e emergência, mesmo durante o período de carência, desde que ultrapassadas 24 horas da contratação do plano.
Art. 35-C. É obrigatória a cobertura do atendimento nos casos: (Redação dada pela Lei nº 11.935, de 2009)
I – de emergência, como tal definidos os que implicarem risco imediato de vida ou de lesões irreparáveis para o paciente, caracterizado em declaração do médico assistente; (Redação dada pela Lei nº 11.935, de 2009)
II – de urgência, assim entendidos os resultantes de acidentes pessoais ou de complicações no processo gestacional; (Redação dada pela Lei nº 11.935, de 2009)
III – de planejamento familiar. (Incluído pela Lei nº 11.935, de 2009)
Parágrafo único. A ANS fará publicar normas regulamentares para o disposto neste artigo, observados os termos de adaptação previstos no art. 35. (Incluído pela Medida Provisória nº 2.177-44, de 2001)
A negativa de cobertura em tais situações pode ensejar a responsabilização do plano por danos morais, conforme entendimento consolidado em diversas decisões judiciais.
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. PLANO DE SAÚDE. NEGATIVA DE COBERTURA . INTERNAÇÃO. URGÊNCIA/EMERGÊNCIA DEMONSTRADA. REEMBOLSO DEVIDO NOS LIMITES DA TABELA DO PLANO DE SAÚDE CONTRATADO. DANO MORAL CONFIGURADO . MAJORAÇÃO. HONORÁRIOS RECURSAIS. 1. Os planos de saúde devem acobertar o beneficiário de saúde em situações de urgência e emergencial, mesmo que ainda não transcorrido o período de carência, consoante dicção do art . 35-C da Lei n.º 9.656/1998. 2 . Para que o usuário do plano de saúde tenha direito ao custeio das despesas médico-hospitalares fora da rede conveniada contratada, é necessário conjugar a ocorrência de uma situação de urgência e/ou emergência e a impossibilidade de utilização da rede credenciada, em decorrência da necessidade de um atendimento célere ou da indisponibilidade do tratamento especializado nos nosocômios locais, nos termos insculpidos no artigo 12, inciso VI, da Lei nº 9.656/98. 3. Afigurando-se impossível a utilização atempada dos serviços autorizados em estabelecimentos credenciados, o art . 12, VI, da Lei nº 9.656/1998 limita o reembolso aos preços e tabelas efetivamente contratados com o plano de saúde em sua rede conveniada. 4. A recusa do plano de saúde em fornecer a cobertura do tratamento, sob o motivo de não ter sido efetivado o prazo de carência previsto no contrato de prestação de serviços, sem prévia análise das hipóteses de urgência ou emergência, configura responsabilidade objetiva passível de indenização por danos morais . 5. Ante as peculiaridades do caso concreto bem como a orientação jurisprudencial firmada em casos análogos, entende-se que o montante condenatório deve ser majorado para R$ 12.000,00 (doze mil) reais, a fim de adequar-se aos parâmetros da razoabilidade e proporcionalidade. 6 . O provimento parcial dos apelos torna descabida a majoração da verba honorária nesta seara recursal, nos termos do art. 85, § 11, do CPC. RECURSOS DE APELAÇÕES CÍVEIS CONHECIDOS E PARCIALMENTE PROVIDOS.
(TJ-GO – Apelação Cível: 52191539620228090051 GOIÂNIA, Relator.: Des(a) . DESEMBARGADOR ANDERSON MÁXIMO DE HOLANDA, Goiânia – 6ª UPJ Varas Cíveis: 26ª, 27ª, 28ª, 29ª, 30ª e 31ª, Data de Publicação: (S/R) DJ)
“APELAÇÃO CÍVEL. PLANO DE SAÚDE. CARÊNCIA. SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA . Sentença de parcial procedência, para determinar às rés a cobertura da internação e de todos e quaisquer procedimentos médicos de que tenha precisado ou ainda precise a autora por causa do fato que substancia a demanda. RECURSO DA RÉ NOTRE DAME. Preliminar de ausência de interesse de agir da autora para a propositura da demanda afastada. Operadora que confirmou, em todas as manifestações, a negativa da internação em razão de prazo de carência . Elementos dos autos que também apontam nesse sentido. Mérito. Insurgência que não prospera. Incontroversa a necessidade de internação em caráter emergencial, constante expressamente dos relatórios médicos e não impugnado de forma específica pela operadora . É abusiva a negativa de cobertura em atendimento de urgência e/ou emergência a pretexto de que está em curso período de carência que não seja o prazo de 24 horas estabelecido na Lei n. 9.656/98. Inteligência das Súmulas 597 do STJ e 103 deste Tribunal . Limitação da internação hospitalar em 12 horas de atendimento que também se revela abusiva. Aplicabilidade da Súmula 302 do STJ. Precedentes. RECURSO DA AUTORA . Acolhimento parcial. A recusa indevida, pela operadora de plano de saúde, de autorizar tratamento médico emergencial enseja reparação a título de danos morais, pois agrava a situação de aflição psicológica e de angústia no espírito do beneficiário, estando caracterizado o dano moral in re ipsa. Entendimento do STJ nesse sentido. Fixação em R$ 10 .000,00, em observância às peculiaridades do caso e aos precedentes desta Câmara. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO DA RÉ NOTRE DAME. RECURSO DA AUTORA PARCIALMENTE PROVIDO.” (v . 40696).
(TJ-SP – Apelação Cível: 10000046820228260545 Atibaia, Relator.: Viviani Nicolau, Data de Julgamento: 25/11/2022, 3ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 25/11/2022)
Ementa: CIVIL E CONSUMIDOR. PLANO DE SAÚDE. PRAZO DE CARÊNCIA. INTERNAÇÃO . EMERGÊNCIA. NEGATIVA DE COBERTURA. INDEVIDA. DANO MATERIAL . COMPROVAÇÃO. RESSARCIMENTO. POSSIBILIDADE. DANO MORAL . CONFIGURADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. MINORAÇÃO. INDEVIDA . 1. O artigo 35-C da Lei nº 9.656/98 estabelece que a cobertura é obrigatória nos casos de emergência e urgência. 2 . Comprovada a situação de emergência, bem como ultrapassado o prazo de 24 (vinte e quatro) horas da contratação (artigo 12, V, c da Lei nº 9.656/98), deve haver a cobertura do plano de saúde com os gastos referentes à internação pelo tempo necessário, conforme prescrição médica, a despeito do prazo de carência previsto no instrumento contratual. 3. É pacífico o entendimento jurisprudencial no sentido de ser abusiva a limitação contratual de cobertura do pelo plano de saúde limitada às primeiras 12 (doze) horas de internação ou atendimento ambulatorial de emergência . Precedentes STJ e TJDFT. 4. Caracterizado o ato ilícito na negativa de cobertura da internação de caráter urgente, correta a condenação do plano de saúde ao pagamento de danos materiais, correspondente aos valores que o segurado despendeu para realizar a cirurgia. 5 . A recusa indevida à cobertura para internação e tratamento pleiteada pelo segurado enseja a ocorrência de danos morais, em razão da potencialização do sofrimento, angústia e aflição. 6. Os danos morais devem ser fixados de forma moderada, atentando-se para os critérios da razoabilidade e proporcionalidade dos danos sofridos e da extensão da culpa, da exemplaridade e do caráter sancionatório da condenação. 7 . Recurso conhecido e desprovido.
(TJ-DF 0717789-87.2023.8.07.0003 1855740, Relator.: MARIA DE LOURDES ABREU, Data de Julgamento: 08/05/2024, 3ª Turma Cível, Data de Publicação: 22/05/2024)
Além disso, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reforça que cláusulas contratuais que impõem carências superiores a 24 horas para atendimentos de urgência são consideradas abusivas.
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. DIREITO DO CONSUMIDOR. PLANO DE SAÚDE . ATENDIMENTO DE EMERGÊNCIA. PERÍODO DE CARÊNCIA. LIMITAÇÃO. ABUSIVIDADE . RECUSA INDEVIDA. DANOS MORAIS. CABIMENTO. SÚMULA Nº 568/STJ . 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. O Superior Tribunal de Justiça consolidou jurisprudência no sentido de ser abusiva a negativa, pelo plano de saúde, de fornecimento dos serviços de assistência médica nas situações de urgência ou emergência com base na cláusula de carência, caracterizando injusta recursa de cobertura que enseja indenização por danos morais . 3. Agravo interno não provido.
(STJ – AgInt no REsp: 2002772 DF 2022/0142011-3, Data de Julgamento: 28/11/2022, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 09/12/2022)
Em caso de recusa, é recomendável que o beneficiário obtenha a negativa por escrito, conforme as regras da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), e procure um advogado especializado para avaliar a possibilidade de ingressar com uma ação judicial visando a obtenção de uma medida liminar que obrigue o plano a custear a internação.
A jurisprudência também destaca que a negativa de cobertura em situações de urgência pode agravar o sofrimento do paciente e de sua família, configurando dano moral passível de indenização 7, 13.
PLANOS DE SAÚDE. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C REPARAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS . PACIENTE DIAGNOSTICADO COM NEOPLASIA NO ESTÔMAGO QUANDO EM CURSO DE CARÊNCIA CONTRATUAL. SITUAÇÃO DE URGÊNCIA/EMERGÊNCIA EVIDENCIADA. NEGATIVA INDEVIDA DE ATENDIMENTO. REEMBOLSO DE DESPESAS MÉDICAS REALIZADAS FORA DA REDE CREDENCIADA . COBERTURA OBRIGATÓRIA. RESSARCIMENTO INTEGRAL. DANO MORAL CARACTERIZADO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO . SENTENÇA REFORMADA. O cerne da controvérsia recursal consiste em verificar se há ou não responsabilidade da operadora de plano de saúde acerca da obrigação de fazer e ao reembolso relativo aos custos da cirurgia realizada pelo beneficiário em hospital não integrante de sua rede credenciada, bem como se a atitude da operadora de não autorizar a realização do procedimento cirúrgico na esfera administrativa ocasionou danos morais ao beneficiário do plano. Do cotejo dos fólios, tem-se que o autor aderiu a plano de saúde individual, com segmentação ambulatorial + hospitalar com parto, em 16/12/2021 (vide carteira do plano de saúde à fl. 3), e, em 27/12/2021, veio a comparecer à unidade hospitalar credenciada à operadora com um quadro sintomático de queimação do estômago, má digestão, dificuldade de deglutição e refluxo ácido . Após realizar novos exames, em 25/01/2022, o paciente descobriu que estava com neoplasia de comportamento incerto ou desconhecido do estômago (CID10 D37.1). Diante disso, em 08/02/2022, o autor solicitou atendimento junto ao hospital da rede credenciada para proceder à realização de cirurgia de urgência, o que foi negado pela operadora do plano de saúde sob a justificativa de que não teria havido o cumprimento do prazo de carência contratual, conforme documento de fl. 7 . Com a negativa, e diante do relatório médico concedido pelo Dr. Marcelo Leite Vieira Costa (CRM 6124), o promovente optou por marcar o procedimento cirúrgico fora da rede credenciada, no Hospital São Carlos, que foi realizado em 21/02/2022, vindo a arcar com os honorários da equipe médica e com a disponibilização da estrutura hospitalar. No bojo do Agravo de Instrumento nº 0624509-35.2022 .8.06.0000, já tive a oportunidade de me deter inicialmente sobre a matéria tratada nestes autos, tendo destacado que a doença experimentada pelo autor, neoplasia no estômago, demonstra a existência de urgência/emergência no tratamento. Levando isso em consideração junto com as demais provas produzidas no processo durante a tramitação na origem, não há como descurar do fato de que o quadro de saúde do demandante deveria, sim, ser enquadrado como de urgência/emergência . Em casos tais, a Lei nº 9.666/98 prevê como obrigatória a cobertura contratual, conforme o art. 35-C Assim, a negativa da operadora de plano de saúde quanto ao oferecimento do tratamento indicado pelo médico assistente ao autor, para doença que revela situação de urgência/emergência, foi conduta abusiva e que não tem respaldo no contrato nem na Lei dos Planos de Saúde, e que deve sofrer as devidas reprimendas. Na espécie, percebe-se que foi a falha na prestação do serviço pela operadora que levou o promovente a buscar tratamento em hospital não credenciado ao plano, eis que havia recebido negativa para o procedimento cirúrgico de urgência que havia solicitado . Desse modo, é possível concluir pela ilicitude da negativa de reembolso por parte da operadora de plano de saúde, pois estava obrigada por lei a custear o atendimento hospitalar do beneficiário em caso de emergência, mesmo que o tratamento tenha sido buscado fora da rede credenciada, haja vista a ausência de provas quanto ao oferecimento do tratamento dentro da rede conveniada ao Hapvida. Diante da urgência/emergência caracterizada pelo quadro de saúde do autor, e pela inexistência de provas quanto ao oferecimento do tratamento necessário junto à rede credenciada ao plano, entendo que o reembolso é devido ao autor e deve ocorrer de forma integral, pois, não fosse a negativa indevida da operadora, o procedimento cirúrgico teria sido realizado dentro da rede credenciada. Em situações tais, de negativa indevida de fornecimento e/ou de prestação de serviço defeituoso, ainda mais considerando o quadro de urgência/emergência de saúde, a jurisprudência deste egrégio Tribunal de Justiça se manifesta no sentido de cabimento de indenização por danos morais ao beneficiário do plano. Desse modo, presume-se o abalo emocional sofrido pelo promovente decorrente da angústia quanto à falha no tratamento prestado pela Hapvida e pela sua rede credenciada, tendo em vista que, mesmo após diagnóstico de doença grave e que evidencia situação de urgência/emergência, teve tratamento injustamente negado no nosocômio credenciado ao plano de saúde . Tudo isso sopesado, o quantum indenizatório no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) se adequa às especificidades do caso concreto e se revela razoável e proporcional a compensar a vítima pelos prejuízos experimentados na ordem dos direitos da personalidade. Recurso conhecido e parcialmente provido. Sentença reformada . DESEMBARGADOR JOSÉ RICARDO VIDAL PATROCÍNIO Relator
(TJ-CE – Apelação Cível: 0212435-11.2022.8.06.0001 Fortaleza, Relator.: JOSE RICARDO VIDAL PATROCÍNIO, Data de Julgamento: 29/05/2024, 1ª Câmara Direito Privado, Data de Publicação: 29/05/2024)
PLANO DE SAÚDE. OBRIGAÇÃO DE FAZER. DANO MORAL. INTERNAÇÃO HOSPITALAR . NEGATIVA DE COBERTURA. PERÍODO DE CARÊNCIA. SITUAÇÃO DE EMERGÊNCIA. PROCEDÊNCIA . APELO DA RÉ. PARCIAL ACOLHIMENTO. Bebê (03 meses) diagnosticado com bronquiolite e outras complicações necessitando, com urgência, de internação hospitalar. Negativa de cobertura . Período de carência contratual. Abusividade. Prazo de carência limitado a 24 horas (art. 12, V, c, da Lei nº 9 .656/98). Incidência das Súmulas 103/TJSP e 597/STJ. Mitigação da carência contratual. Precedentes citados . Dano moral in re ipsa. Configuração. Valor minorado para R$10.000,00 (dez mil reais) que se adequa ao entendimento desta 2ª Câmara de Direito Privado para casos de recusa de cobertura por carência contratual envolvendo recém-nascido . Verba honorária mantida. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
(TJ-SP – Apelação Cível: 1028735-67.2022.8.26.0224 Guarulhos, Relator.: Fernando Marcondes, Data de Julgamento: 15/05/2024, 2ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 15/05/2024)
Portanto, é importante agir rapidamente para resguardar os direitos do paciente e garantir o acesso ao tratamento necessário.
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