Quais são as diferenças entre o Direito Positivo e a Ciência do Direito?

Muitos autores possuem diversos conceitos e definições acerca do que seria Direito Positivo e o que seria Ciência do Direito. Há, inclusive, discussões acerca de poder o Direito ser mesmo considerado ou não como Ciência.

Por isso, tentarei responder essa pergunta da forma mais simples possível, evitando entrar em muitas discussões. Apresentarei somente alguns autores.

DIREITO POSITIVO:

Historicamente, segundo CARLA FARALLI, existe uma visão clássica que divide o direito em jusnaturalismo (Direito Natural) e juspositivismo (Direito Positivo).

Porém, Faralli critica os que dizem que o direito positivo superou o direito natural no decorrer da história, já que atualmente ainda existem juristas adeptos ao jusnaturalismo.

Então, ela diz que essa não pode ser uma classificação estática (já que cada teoria simplesmente não substitui a anterior).

Para Faralli, o que acontece de fato é mais uma transformação progressiva e convivência de ideias, ou seja, as teorias novas não eliminam as antigas, e sim coexistem com elas até que, com o tempo, o contexto social faz com que algumas deixem de fazer sentido. Exemplo atual de um jusnaturalista é John Finnis, filósofo do direito australiano que hoje tem 84 anos. Porém, é certo que, atualmente, a teoria que mais “faz sentido” é o positivismo jurídico.

O conceito de Direito Positivo surgiu com a positivação do direito, ocorrida com o declínio do jusnaturalismo, iniciado com a intensificação da valorização da ciência moderna. Assim, passou-se a ser considerado que “o direito positivo era a única forma verdadeira de direito pela ruptura com as teses jusnaturalistas” e “se passou a tentar construir sua base teórica a partir de métodos científicos, em detrimento da base metafísica do direito natural”.[1] No “sentido sociológico, a positivação do direito foi um fenômeno que, no século XIX, representou a crescente valorização da lei como fonte de direito”[2].

Mesmo assim, o pensamento jurídico atual abrange, no debate filosófico do direito, muito mais temas do que antigamente[3], com a abertura do Direito aos valores (ética, moral, política) e aos fatos (contexto social, realidades institucionais). Essas diretrizes são respostas à crítica ao juspositivismo, especialmente ao modelo formalista[4] do direito que dominava até os anos 1960.

Esse modelo formalista diz respeito à ideia de que o Direito deve ser um sistema fechado em si mesmo, que não admite valores ou fatos. Esse modelo se baseia na ideia de que não é possível avaliar moralmente o direito, nem encontrar critérios morais objetivos para decisões jurídicas ou políticas. Esse modelo foi influenciado pelas ciências sociais do século XIX, que rejeitavam a moral na ciência, bem como pela filosofia analítica do século XX, que considerava a moral como algo subjetivo. Isso é perigoso, pois as leis, sem vislumbrar princípios humanos, podem se tornar um perigo à humanidade, como ocorreu na Alemanha nazista (soldados e funcionários públicos apenas estavam seguindo a lei, sem questionar acerca da dignidade humana). Você pode ler, sobre isso, “Eichmann em Jerusalém”, livro de Hannah Arendt, que trouxe o conceito de “banalidade do mal”.[5]

Ainda seguindo os ensinamentos de Faralli, hoje, tanto a filosofia analítica quanto a ideia de uma ética sem objetividade foram questionadas. Isso abriu espaço para uma filosofia do direito mais conectada com valores éticos e com a realidade social. Os jusfilósofos Ronald Dworkin e Herbert Hart são dois nomes centrais no debate de abertura aos valores. Dworkin, especialmente, defende que o direito envolve interpretações morais. Quanto a abertura aos fatos, os nomes de Ota Weinberger e Neil MacCormick se destacam, entendendo que o direito está sempre inserido numa realidade social e institucional concreta.

Neste sentido, conforme explica TÉRCIO SAMPAIO FERRAZ JR. que, em seu desenvolvimento, o positivismo jurídico configurou-se em diversas tendências que dominaram o século XIX, transformando a ciência do direito ora em dogmática jurídica como ciência positiva da norma, ora em sociologia, ora em psicologia da vida do direito.

O Direito Positivo seria, especificamente, uma contraposição à ideia de jusnaturalismo, sendo apresentado como o único tipo de direito reconhecido a partir do século XIX, após a crise do direito natural. Por este entendimento, o direito é um produto humano, sempre produzido para o homem, não tendo advindo da natureza, de algo metafísico, divino ou moral. Ademais, ele é estabelecido dentro de um contexto histórico-social e se expressa por meio de normas impostas pelo poder soberano. A partir dessa visão, todo direito que existe de fato em uma sociedade é aquele que é posto (imposto) por uma autoridade legítima – como o Estado.

Com a queda do jusnaturalismo, os direitos que antes eram vistos como naturais (como liberdade, propriedade etc.) foram positivados (ou seja, transformados em leis). A partir de então, todo e qualquer direito é uma criação humana: Direito positivo.

Ou seja, o direito positivo é: Criado por seres humanos; Estabelecido dentro de um contexto histórico-social; Expressado por meio de normas impostas pelo poder soberano; E não decorre de uma ordem natural, divina ou moral.
Direito Positivo x Direito Natural O texto explica que, na tradição jusnaturalista, acreditava-se que existiam dois tipos de direito: Direito Natural – Vindo da razão, de Deus ou da natureza. Direito Positivo – Criado pelos homens. Mas essa ideia entra em crise a partir do século XIX, com a racionalização do pensamento jurídico.

A validade do Direito passa a não ser mais delegada à moral ou à natureza. Surgem novas discussões sobre o fundamento do Direito e sua validade.

Um dos primeiros pensadores a tratar sobre o assunto foi John Austin (Inglaterra, 1790 – 1859), que definiu o direito como “comandos coercitivos do soberano”. A validade que ele atribuiu ao direito foi a imposição do “soberano”, ou seja, o comando de uma autoridade legítima (de quem detém o poder soberano, aceito habitualmente pela sociedade). Foi ele também o primeiro que falou em coerção no Direito. Para ele, a lei é uma ordem (não um pedido, sugestão ou conselho), e que tem coercitividade (é imposta sob ameaça de sanção, ou seja, há uma punição caso não seja cumprida).

Depois, vieram outros jusfilósofos com outras definições de direito positivo. Atualmente essa visão de Austin foi superada por outros jusfilósofos (Kelsen[6], Dworkin, Hart…).

Em resumo, direito positivo é: 🔹 O conjunto de normas criadas por uma autoridade humana (geralmente o Estado), válidas em um determinado tempo e lugar, impostas com o uso da força (coerção), e aceitas pela sociedade como obrigatórias.

CIÊNCIA DO DIREITO:

Como sabemos, a ciência surge a partir das ciências naturais e o direito começou a tentar se igualar a essas ciências naturais quando elas adquiriram valorização como a forma de se encontrar “a verdade” sobre as coisas.[7]

Tendo em vista que a Ciência do Direito difere das ciências naturais e sociais (sendo uma ciência construída), consoante Nunes, é possível dizer que “até mesmo nos dias atuais, apesar de a maioria dos estudiosos tratar o direito como ciência, o caráter científico do direito ainda é colocado em questão por alguns, diante da dificuldade encontrada para estabelecer com unanimidade quais são os elementos que qualificam o direito como ciência, bem como da diversidade de escolas de pensamentos que propuseram diferentes formas de investigação para a ciência jurídica.”[8]

Essa preocupação em caracterizar o direito como ciência tem relação com o antigo problema da busca pela verdade.[9]

Como já explicitado anteriormente, “o modelo moderno de ciência, ao surgir, gerou a crença de que a ciência pode e deve conhecer tudo, que “a ciência conhece tudo e é a explicação causal das leis da realidade tal como esta é em si mesma”[10]. Por isso, “um saber só era legitimado se fosse elevado ao estatuto científico.”[11]

Contudo, “este modelo científico moderno baseava-se no modelo das ciências matemáticas, que não era suficiente para explicar o conhecimento jurídico”.[12]

Notando tal circunstância, muitos jusfilósofos buscaram um modo de compreender o saber jurídico que respeitasse as suas especificidades.

Eu gosto, sobretudo, do modo de pensar de THEODOR VIEHWEG, que trouxe as noções de pensamento dogmático e zetético.

No Brasil, o jurista Tércio Sampaio Ferraz Jr. seguiu os estudos do jurista alemão Viehweg, apresentando o pensamento dele ao público brasileiro.

Para TÉRCIO SAMPAIO FERRAZ JR., outras teorias jurídicas surgiram após Kelsen [e Austin, que eu citei acima], concebendo o direito como norma, ou como fenômeno empírico etc., porém, todas essas visões são tendências que ainda não nos fornecem uma visão ordenada do que se poderia chamar de ciência do direito.[13] Então, Ferraz Jr. começa a explicar as bases de sua própria teoria do que seria Direito Positivo e Ciência do Direito, que é uma teoria bastante aceita atualmente.

A CIÊNCIA DO DIREITO para o TÉRCIO SAMPAIO FERRAZ JR. tem um conceito próprio. A visão de Tércio Sampaio Ferraz Jr. sobre a ciência do direito é profundamente influenciada pela mudança de paradigma que ele identifica na teoria jurídica contemporânea. Para Ferraz Jr., a ciência do direito não pode mais ser vista como uma simples busca pela verdade objetiva, como nas ciências naturais. A ideia de que o direito busca uma verdade universal, de caráter imutável, foi substituída por uma abordagem mais pragmática e funcional. Ele destaca, de forma central, que o direito moderno é um saber tecnológico, ou seja, uma disciplina que opera para gerar decisões eficazes e decidíveis, voltadas para resolver conflitos sociais de maneira prática.

Essa visão implica que o direito não lida com a verdade no sentido clássico, mas com a decidibilidade, ou seja, com a capacidade de fornecer decisões normativas que possam ser aplicadas de maneira eficiente. Em vez de buscar a verdade refutável de um fato, a ciência do direito moderna busca determinar a aplicabilidade e eficácia de normas para a solução de questões concretas.

Portanto, para Ferraz Jr., a ciência do direito é uma prática que combina elementos de tecnologia normativa, com uma estrutura dogmática que permite a operacionalização da lei.

Porém, é certo que é preciso estar em constante vigilância para essa ciência não se tornar uma prática autoritária ou formalista. No meu livro, expressei a preocupação com o risco de o direito se tornar uma “máquina normativa” que perde sua capacidade crítica e reflexiva, o que comprometeria sua função social e sua legitimidade.

Em resumo, com base no conceito de Tércio, a ciência do direito pode ser entendida como um saber técnico e pragmático.

Na minha particular visão, a Ciência do Direito envolve:

  1. O direito como uma tecnologia social, voltada para a resolução de conflitos por meio de decisões pragmáticas.
  2. A necessidade de equilíbrio entre a aplicação prática das normas e a reflexão crítica (a zetética), para evitar que o direito se reduza a uma ferramenta de controle desprovida de sentido normativo profundo.
  3. O reconhecimento do formalismo extremo como um perigo que, quando exacerbado, transforma conceitos normativos em caixas vazias, afastando-os da realidade social e tornando-os desprovidos de significado prático.

CIÊNCIA DO DIREITO X DIREITO POSITIVO:

Agora vou falar sobre esse assunto com base em doutrinadores tributários, já que vc está estudando para a prova de Direito Tributário.

  • Ainda, além dos conceitos trazidos anteriormente com base em outros autores, trago agora o PAULO DE BARROS CARVALHO, DOUTRINADOR TRIBUTÁRIO, segundo o qual o Direito Positivo é um sistema prescritivo, com linguagem direcionada às condutas humanas, enquanto a Ciência do Direito é um sistema teorético, com linguagem de caráter descritivo[14].

Em sua doutrina, “Curso de Direito Tributário”[15], Paulo de Barros Carvalho faz uma análise detalhada da diferença entre direito positivo e ciência do direito, abordando as peculiaridades de cada um.

  • DOIS MUNDOS DISTINTOS (DIFERENÇA ENTRE DIREITO POSITIVO E CIÊNCIA DO DIREITO):

O professor Paulo de Barros Carvalho começa destacando que o direito positivo e a ciência do direito pertencem a dois mundos distintos, com linguagens e funções diferentes. Eles não se confundem e, por isso, exigem uma consideração própria para cada um, dado que pertencem a campos diferentes do conhecimento jurídico.

  • Linguagens diferentes: o direito positivo usa uma linguagem prescritiva, enquanto a ciência do direito usa uma linguagem descritiva.
  • Funções distintas: o direito positivo visa regular a conduta das pessoas na sociedade por meio de normas e regras, enquanto a ciência do direito busca descrever, analisar e explicar essas normas.
  • LINGUAGENS DISTINTAS:
  • Direito Positivo: O direito positivo é descrito como uma linguagem prescritiva, ou seja, prescreve comportamentos. Ele define o que as pessoas podem ou não fazer, como uma ordem normativa para regular a vida social. Portanto, o direito positivo é prescritivo, ou seja, busca ordenar a conduta das pessoas por meio de normas jurídicas. Ele impõe regras de como os indivíduos devem se comportar na sociedade.
  • Ciência do Direito: Por outro lado, a ciência do direito é uma linguagem descritiva. Ela não altera o que as normas prescrevem, mas se limita a descrever o conteúdo dessas normas, suas inter-relações, estruturas e significados. A ciência do direito, portanto, é descritiva. Ela não cria ou impõe normas, só se dedica a estudar, descrever, interpretar e organizar as normas jurídicas já existentes, explicando como elas funcionam, como se relacionam e como influenciam a conduta das pessoas. Busca organizar essas normas e entender como se conectam entre si, descrevendo-as de forma sistemática e lógica. Seu produto é descritivo, visando entender o funcionamento do sistema normativo, sem se preocupar com a aplicação prática ou com a validade das normas.
  • LÓGICAS DISTINTAS:
  • O direito positivo se baseia em uma lógica deôntica, que lida com o “dever-ser”, ou seja, com a obrigação de agir de determinadas formas.
  • A ciência do direito, por outro lado, emprega uma lógica apofântica, que está relacionada à lógica clássica da ciência, ou seja, com a busca da verdade e da falsidade, em um contexto de descrição.

Essa distinção entre as lógicas implica que, enquanto as proposições do direito positivo podem ser válidas ou inválidas, as proposições da ciência do direito são verdadeiras ou falsas, pois se referem a um estudo descritivo das normas.

  • SISTEMA JURÍDICO:

Paulo de Barros Carvalho destaca que tanto o direito positivo quanto a ciência do direito formam sistemas. O sistema do direito positivo é um conjunto de normas interligadas, com relações de subordinação e coordenação entre elas. Já o sistema da ciência do direito é uma camada descritiva que descreve o direito positivo, oferecendo uma visão mais estruturada e sistemática.

  • O Sistema Do Direito Positivo E O Sistema Da Ciência Do Direito:

Paulo de Barros Carvalho explica que o direito positivo forma um sistema empírico, composto por normas jurídicas inter-relacionadas. Esse sistema normativo se refere à realidade das normas que governam a sociedade em um dado momento histórico e geográfico.

  • O direito positivo tem como objetivo regular o comportamento das pessoas na sociedade. Ele é composto por normas jurídicas que interagem de maneiras diferentes, por meio de relações de coordenação e hierarquia.
  • Por outro lado, a ciência do direito se debruça sobre esse sistema do direito positivo e o descreve. Ela analisa as normas jurídicas, suas interações e estruturas, sem criar ou modificar as normas.
  • ANTINOMIAS E CONTRADIÇÕES NO DIREITO POSITIVO:
  • Direito Positivo: O sistema de direito positivo pode ter lacunas ou contradições (como normas conflitantes), mas isso não compromete a validade das normas, pois, em caso de contradição, o sistema jurídico sempre estabelece critérios para resolver o conflito, como a hierarquia ou a revogação de normas anteriores. Logo, para resolver essas contradições, o aplicador do direito deve escolher qual norma prevalece, com base em critérios como a hierarquia das normas ou a primazia temporal.
  • Ciência do Direito: Já no campo da ciência do direito, contradições não são aceitáveis. As proposições científicas devem ser coerentes e não podem se contradizer, pois isso destruiria a lógica interna do sistema científico. Portanto, na ciência do direito, essas contradições não podem existir, pois a ciência exige que as proposições sejam coerentes e não contraditórias. A ciência do direito deve ser um sistema lógico e consistente, livre de antinomias, enquanto o sistema do direito positivo pode conter contradições temporárias que só serão resolvidas com a elaboração de novas normas.
  • OBJETO DA CIÊNCIA DO DIREITO:

O objeto da ciência do direito é o próprio direito positivo. A ciência se ocupa do estudo das normas jurídicas como elas estão no presente (no “hic et nunc”, ou seja, no momento presente). Ela não se interessa por normas que já perderam a validade ou por normas futuras. Logo, a ciência do direito tem como objeto o direito positivo enquanto realidade normativa, e seu trabalho consiste em estudar e descrever esse sistema de normas jurídicas. O cientista do direito se dedica a entender como as normas se relacionam, como funcionam e como regulam as condutas intersubjetivas.

  • MÉTODO DA CIÊNCIA DO DIREITO:

A ciência do direito exige um corte metodológico: ela se concentra no direito vigente (o direito positivo do momento), e não aborda o direito passado (que já foi revogado) ou o futuro (que ainda não foi criado). A dogmática jurídica, que é a base da ciência do direito, se dedica a entender o funcionamento das normas jurídicas e como elas se articulam dentro de um sistema legal. Assim, a ciência do direito é descritiva e busca entender o sistema normativo tal como ele se apresenta no momento presente (hic et nunc), ou seja, considerando o direito posto no momento atual, sem se preocupar com normas passadas que não estão mais em vigor ou com normas futuras que ainda não existem.

  • CORTE METODOLÓGICO NA CIÊNCIA DO DIREITO:

Paulo de Barros Carvalho também destaca a importância de um corte metodológico na ciência do direito, o que implica em focar exclusivamente no direito positivo vigente, desconsiderando normas do passado ou possibilidades futuras. Isso é essencial para uma análise científica coerente e estruturada.

  • RESUMO:
  • Direito Positivo: Conjunto de normas jurídicas que regulam o comportamento das pessoas em sociedade, com linguagem prescritiva e lógica deôntica.
  • Ciência do Direito: Campo de estudo que se dedica a descrever e analisar o direito positivo, com linguagem descritiva e lógica apofântica. A ciência do direito busca entender como o sistema jurídico funciona, sem modificar as normas.

Paulo de Barros Carvalho enfatiza que é fundamental não misturar esses dois campos, pois eles têm objetivos, métodos e lógicas distintas. A ciência do direito, ao descrever o direito positivo, deve respeitar sua natureza prescritiva, mas ao mesmo tempo manter a coerência e a lógica científica.

DIREITO POSITIVOCIÊNCIA DO DIREITO
NaturezaSistema prescritivoSistema teorético
LinguagemPrescritiva (normativa)Descritiva
FunçãoRegulamentar condutas sociaisEstudar, descrever e sistematizar o direito positivo
Lógica utilizadaDeôntica (dever-ser)Apofântica (verdade/falsidade)
Coerência internaPode conter contradições e antinomias resolvidas pelo sistema (hierarquia, tempo etc.)Deve ser logicamente consistente; não pode haver contradições
ObjetoNormas jurídicas vigentes em determinada sociedadeO próprio Direito Positivo (vigente no hic et nunc)
MétodoNormativo, voltado à aplicação práticaDescritivo, voltado à sistematização e análise
SistemaConjunto de normas interligadas por coordenação e subordinaçãoEstrutura teórica que descreve o sistema normativo vigente
  • DIREITO TRIBUTÁRIO COMO RAMO DIDATICAMENTE AUTÔNOMO E A IDEIA DA UNIDADE DO DIREITO:

1. O “falso problema” da autonomia:

Paulo de Barros Carvalho questiona a tentativa de definir o Direito Tributário como um ramo autônomo, como se fosse um pedaço isolado do Direito. Ele chama isso de “falso problema” porque:

  • O Direito é um sistema uno: não faz sentido dividir o Direito em caixinhas fechadas, pois todas as suas partes estão interligadas. As normas jurídicas formam uma rede, um “tecido” normativo em que tudo está relacionado.
  • Separar ramos do Direito é algo didático, não ontológico. Serve para organizar o ensino e o estudo, mas não corresponde a uma divisão “real” dentro do sistema jurídico.

Exemplo que ele usa: ao estudar a regra-matriz do IPTU (um tributo municipal), você precisa de conceitos do Direito Civil (propriedade, posse, bem imóvel), Direito Administrativo (delimitação do perímetro urbano), e Direito Constitucional (competência do Município). Ou seja: o Direito Tributário depende de vários outros ramos.

2. Direito Tributário Positivo x Ciência do Direito Tributário:

Paulo de Barros Carvalho faz uma distinção importante:

  • Direito Tributário Positivo: é o objeto de estudo, o conjunto das normas jurídicas que tratam da instituição, arrecadação e fiscalização de tributos.
  • Ciência do Direito Tributário: é o conhecimento sistemático dessas normas. Ou seja, é o trabalho de quem estuda e interpreta essas normas, criando proposições descritivas sobre elas.

3. Elementos da definição:

Paulo de Barros Carvalho propõe uma definição de Direito Tributário, mas com várias ressalvas e explicações:

a) “Ramo didaticamente autônomo do Direito”

  • Ele aceita que se chame o Direito Tributário de “ramo” autônomo, mas só para fins didáticos.
  • Rejeita a ideia de autonomia científica ou ontológica, pois o Direito Tributário depende das demais áreas (civil, constitucional, administrativo etc.).

b) “Integrado pelo conjunto das proposições jurídico-normativas”

  • São as normas positivas (efetivamente postas pelo ordenamento).
  • Estão em vários níveis hierárquicos: Constituição, leis ordinárias, complementares, decretos, portarias, jurisprudência etc.

c) “Que correspondam, direta ou indiretamente, à instituição, arrecadação e fiscalização de tributos”

  • Nem todas as normas tributárias estão “rotuladas” como tal — algumas vêm de outros ramos do Direito.
  • Ele defende que todas as normas que tenham impacto direto ou indireto sobre a tributação devem ser consideradas parte do campo de estudo do Direito Tributário.

Exemplo: o conceito de “propriedade” é do Direito Civil, mas influencia diretamente a incidência do IPTU — portanto, importa ao Direito Tributário.

4. Conclusão: a interdependência normativa:

Paulo de Barros Carvalho afirma que:

  • O Direito Tributário não tem institutos “exclusivos” — tudo está ligado.
  • A discussão sobre autonomia é inútil, porque tudo que afeta a tributação pode (e deve) ser estudado no campo tributário, independentemente da sua origem formal.

5. Sobre o Conceito de Tributo:

Ele finaliza dizendo que a definição de Direito Tributário ficaria tautológica (redundante) se não se explicasse o que é “tributo” — que é o núcleo da matéria. Mas ele deixa isso para o próximo capítulo do livro.

6. Resumindo com uma frase do próprio Paulo de Barros Carvalho: “O Direito Tributário está visceralmente ligado a todo o universo das regras jurídicas em vigor, não podendo dispensar, nas suas construções, qualquer delas, por mais distante que possa parecer.”

Direito Tributário segundo Paulo de Barros Carvalho:

 EXPLICAÇÃO / RESUMO
Autonomia do Direito TributárioÉ apenas didática, não ontológica. O Direito é uno e interdependente.
Falso problema da autonomiaA divisão em ramos serve apenas à organização do ensino. A aplicação prática exige diálogo com outros ramos (civil, constitucional, administrativo etc.).
Direito Tributário PositivoConjunto de normas jurídicas que tratam da instituição, arrecadação e fiscalização de tributos.
Ciência do Direito TributárioConhecimento sistemático que analisa e descreve as normas tributárias.
Definição (elementos)1. Ramo didaticamente autônomo do Direito
2. Conjunto de proposições jurídico-normativas
3. Relacionadas direta ou indiretamente à tributação
Exemplo importanteO IPTU exige conhecimentos de Direito Civil (propriedade), Administrativo (perímetro urbano) e Constitucional (competência municipal).
Interdependência normativaNão há institutos exclusivamente tributários. O Direito Tributário dialoga com todo o sistema jurídico.
Sobre o conceito de tributoFundamental para compreender o Direito Tributário.
  • Para AURORA TOMAZINI DE CARVALHO[16], que segue as ideias de Paulo de Barros Carvalho, DIREITO POSITIVO é o conjunto de normas criadas pelo legislador e outras autoridades e a CIÊNCIA DO DIREITO é o estudo e a explicação dessas normas. Assim, o direito positivo e a ciência do direito são conceitos distintos, com funções e objetivos diferentes.
  • DIREITO POSITIVO: Aurora Tomazini define o direito positivo como o conjunto de normas jurídicas criadas pelas autoridades competentes, como o legislador, ou seja, é o direito em vigor, estabelecido pelas leis, regulamentos, constituições e outras normas oficiais que compõem o ordenamento jurídico de um país ou sistema legal.

O direito positivo é caracterizado por ser:

  • Prescritivo: As normas jurídicas prescrevem comportamentos a serem seguidos pelos indivíduos.
  • Normativo: Consiste em um conjunto de regras que orientam as condutas na sociedade e são aplicáveis aos casos concretos.
  • Posicionado no tempo e espaço: O direito positivo é o direito vigente, válido e em vigor, e reflete as condições sociais, políticas e econômicas do momento histórico em que é criado.

O direito positivo refere-se ao direito tal como ele é formulado e aplicado na prática, ou seja, as normas jurídicas que têm eficácia e estão em vigor em uma determinada sociedade.

  • CIÊNCIA DO DIREITO: Por outro lado, Aurora Tomazini distingue a ciência do direito do direito positivo. A ciência do direito é o campo de estudo do direito, ou seja, a disciplina que se dedica à análise, interpretação e explicação das normas jurídicas. A ciência do direito não cria normas jurídicas, mas estuda as normas já existentes, seu funcionamento, sua interpretação, e sua aplicação.

A ciência do direito pode ser vista como:

  • Descritiva e explicativa: Ela descreve o direito positivo e suas instituições, buscando entender o significado e a aplicação das normas jurídicas.
  • Teórica e reflexiva: Ao invés de criar normas, a ciência do direito reflete sobre elas, investiga seus fundamentos, seus efeitos e a relação entre normas e realidade social.
  • Autônoma e independente: A ciência do direito não está diretamente vinculada à criação ou à modificação das normas, mas apenas à sua análise crítica e explicação.

A autora deixa claro que a linguagem prescritiva do direito (o direito positivo) não se altera pela linguagem descritiva da ciência do direito, que a toma apenas como objeto de estudo, sem modificar ou criar novas normas.

  • Resumo das Diferenças entre Direito Positivo e Ciência do Direito:
  • Direito Positivo: Refere-se ao conjunto de normas jurídicas criadas e em vigor, aplicáveis à sociedade, com o objetivo de regular comportamentos e resolver conflitos.
  • Ciência do Direito: É o campo de estudo que se dedica à análise, descrição e interpretação das normas jurídicas, mas sem criar ou modificar o direito. Ela apenas estuda e explica as normas jurídicas dentro de seu contexto.

Esses conceitos estão intimamente ligados, mas a diferença principal é que o direito positivo é a prática normativa, enquanto a ciência do direito é o estudo acadêmico e teórico dessas normas.


ALGUNS LIVROS QUE INDICO PARA LER SOBRE O ASSUNTO:

  1. FARALLI, Carla. A filosofia contemporânea do direito. – https://www.amazon.com.br/filosofia-contempor%C3%A2nea-do-direito/dp/8560156054
  2. MUÑOZ, Alberto Alonso. Transformações na teoria geral do direito: argumentação e interpretação do jusnaturalismo ao pós-positivismo. São Paulo: Quartier Latin, 2008 – https://shopee.com.br/Livro-Transforma%C3%A7%C3%B5es-na-Teoria-Geral-do-Direito-Argumenta%C3%A7%C3%A3o-e-Interpreta%C3%A7%C3%A3o-do-Jusnaturalismo-ao-P%C3%B3s-Positivismo-Alberto-Alonso-Mu%C3%B1oz-i.362449784.22192473607
  3. BATALHA, Carlos Eduardo. A filosofia jurídica como saber metaideológico: anotações a partir da função social da dogmática jurídica no enfoque de Tercio Sampaio Ferraz Jr. In: Nas fronteiras do formalismo. José Rodrigo Rodriguez (Autor) – https://www.amazon.com.br/Nas-Fronteiras-Formalismo-Direito-Debate/dp/8502084313
  4. Livro Filosofia Do Direito (coleção Os 10+ | Volume 20) – BATALHA, Carlos Eduardo / SCHAHIN, Marcos Renato – https://www3.livrariacultura.com.br/filosofia-do-direito-1a-edicao-de-2012-29575904/p

E claro, se quiserem ler o meu tbm…


REFERÊNCIAS:

[1] VALERA, Renata. O diálogo entre dogmática e zetética jurídicas no desenvolvimento do discurso jurídico científico. São Paulo: All Print Editora, 2022, p. 25-28.

[2] Tércio Sampaio Ferraz Jr., citado por Renata Valera. Op. Cit., p. 25-28.

[3] O debate jurídico em filosofia do direito antigamente se limitava mais às perguntas tradicionais como a divisão entre jusnaturalismo e positivismo. Hoje em dia, esse debate também se volta para novas questões ligadas às mudanças sociais e políticas globais. Então é um debate mais fragmentado, diversificado e fluído.

[4] https://www.amazon.com.br/Eichmann-em-Jerusal%C3%A9m-Hannah-Arendt/dp/8571649626

[5] FERRAZ JR., Ciência do direito, p. 32.

[6] “Kelsen concebe o direito como positivo, advento da vontade humana, e como científico, atribuindo-lhe independência (pelo princípio da pureza) e objetividade (através do método do sistema escalonado de normas, a identificar uma norma jurídica, uma estrutura de dever, com sentido de obrigatoriedade, mediante sua validade, e eficácia).” VALERA, Renata. Op. Cit., p. 37.

[7] Tércio Sampaio Ferraz Jr., citado por Renata Valera. Op. Cit., p. 31.

[8] NUNES, Rizzatto (Manual de introdução ao estudo do direito, p. 47), citado por Renata Valera. Op. Cit., p. 37.

[9] A busca pela verdade através da ciência, de acordo com Marilena Chaui, demonstra a “confiança que a cultura ocidental deposita na razão como capacidade para conhecer a realidade”. Desse modo, a preocupação num estudo científico do fenômeno jurídico compreende o esforço de conhecer o direito real, o direito de verdade.

[10] CHAUI, Op. Cit., p. 235., citada por VALERA, Renata. Op. Cit., p. 37.

[11] VALERA, Renata. Op. Cit., p. 37.

[12] ROESLER, Claudia Rosane (Theodor Viehweg e a ciência do direito, p. 47), citada por VALERA, Renata. Op. Cit., p. 37.

[13] FERRAZ JR., Ciência do direito, p. 39.

[14] BARRETO, Simone Rodrigues Costa. Mutação do conceito constitucional de mercadoria, 1. ed. São Paulo: Noeses, 2015, p.13.

[15] CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário (Capítulo I). 31. ed. São Paulo: Noeses, 2021, p. 5-20.

[16] CARVALHO, Aurora Tomazini de. Teoria Geral do Direito (o construtivismo lógico-semântico).


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