DEFINIÇÃO DE USUCAPIÃO

Usucapião é um meio de aquisição da propriedade através da posse continuada e dos demais requisitos estabelecidos em lei. Trata-se de meio originário de aquisição da propriedade (e não derivado). Por isso, a propriedade que vier da usucapião não carrega as qualidades da propriedade anterior (logo, se, por exemplo, um proprietário vende um bem imóvel para outra pessoa, mas esse proprietário original tinha dívidas que trouxeram penhoras para o imóvel, ao vendê-lo, o bem vai com as penhoras para o próximo proprietário… mas isso não acontece na usucapião).

É meio de aquisição da propriedade = transforma posse em propriedade. Não é só transmutação de instituto jurídico, também é uma mudança patrimonial, pois a posse vale menos e a propriedade vale mais, do ponto de vista do direito imobiliário (do mercado imobiliário). Agrega valoração no patrimônio.

A base da usucapião é a posse.

REQUISITOS DA USUCAPIÃO

REQUISITOS GERAIS:

  • Posse com animus domini (posse com ânimo de dono, possui como se for dono)
  • Posse contínua e sem oposição
  • Pelo tempo legal

REQUISITOS ESPECÍFICOS:

Variam conforme o tipo da usucapião

Usucapião extraordinária – Art. 1238 CC

Art. 1.238. Aquele que, por quinze anos, sem interrupção, nem oposição, possuir como seu um imóvel, adquire-lhe a propriedade, independentemente de título e boa-fé; podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentença, a qual servirá de título para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.

Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.

Requisitos:

  • Posse por 15 anos
  • Não precisa de justo título ou boa-fé
  • Prazo pode ser reduzido para 10 anos, se o possuidor (que vai usucapir) fez do imóvel sua morada ou fez obra de caráter produtivo

Usucapião ordinária – Art. 1242 CC

Art. 1.242. Adquire também a propriedade do imóvel aquele que, contínua e incontestadamente, com justo título e boa-fé, o possuir por dez anos.

Parágrafo único. Será de cinco anos o prazo previsto neste artigo se o imóvel houver sido adquirido, onerosamente, com base no registro constante do respectivo cartório, cancelada posteriormente, desde que os possuidores nele tiverem estabelecido a sua moradia, ou realizado investimentos de interesse social e econômico.

Requisitos:

  • Posse por 10 anos
  • Precisa de justo título ou boa-fé
  • Prazo pode ser reduzido para 5 anos, se o usucapiente fez do imóvel sua morada ou fez obras de caráter relevante

Usucapião especial (constitucional) urbana – Art. 183, CF e Art. 1240 CC

Art. 1.240. Aquele que possuir, como sua, área urbana de até duzentos e cinqüenta metros quadrados, por cinco anos ininterruptamente e sem oposição, utilizando-a para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural.

§ 1º O título de domínio e a concessão de uso serão conferidos ao homem ou à mulher, ou a ambos, independentemente do estado civil.

§ 2º O direito previsto no parágrafo antecedente não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.

Requisitos:

  • Posse de 5 anos
  • Área urbana
  • Posse direta – morada habitual (nas outras espécies de usucapião o usucapiente pode, por exemplo, arrendar ou alugar o imóvel, nesta espécie de usucapião não pode!)
  • Limitação de área: Tamanho de área de até 250m²
  • Não pode ser dono de outro imóvel (nem rural, nem urbano)
  • Só pode fazer uso dessa usucapião uma única vez

Usucapião especial (constitucional) rural – Art. 1239 CC

Art. 1.239. Aquele que, não sendo proprietário de imóvel rural ou urbano, possua como sua, por cinco anos ininterruptos, sem oposição, área de terra em zona rural não superior a cinqüenta hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia, adquirir-lhe-á a propriedade.

Requisitos:

  • Posse de 5 anos
  • Área rural
  • Posse direta – morada habitual ou tornou a área produtiva com seu trabalho ou de sua família
  • Limitação de área: Até 50 hectares
  • Não pode ser dono de outro imóvel (nem rural, nem urbano)
  • Pode usar mis de uma vez (pois a CF/88 não repete a exigência de que só pode fazer uso dessa usucapião uma única vez)

Usucapião conjugal – Art. 1240-A, CC

Art. 1.240-A. Aquele que exercer, por 2 (dois) anos ininterruptamente e sem oposição, posse direta, com exclusividade, sobre imóvel urbano de até 250m² (duzentos e cinquenta metros quadrados) cuja propriedade divida com ex-cônjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar, utilizando-o para sua moradia ou de sua família, adquirir-lhe-á o domínio integral, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. (Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

§ 1o O direito previsto nocaput não será reconhecido ao mesmo possuidor mais de uma vez.

§ 2o(VETADO)(Incluído pela Lei nº 12.424, de 2011)

Requisitos:

  • Posse de 2 anos
  • Área urbana
  • Limitação de área: Até 250m²
  • Propriedade que dividia com o ex-conjuge ou ex-companheiro que abandonou o lar
  • Moradia
  • Não pode ser dono de outro imóvel (nem rural, nem urbano)

Usucapião coletiva – Art. 10 da Lei 10.257/2001 (Estatuto da Cidade) – Não está no CC!

Requisitos:

  • Posse por 5 anos
  • Posse por população de baixa renda
  • Posse para finalidade de morada

O juiz atribuirá uma fração ideal a cada possuidor. A área usucapida passa a ser um condomínio entre os moradores.

PRESCRIÇÃO AQUISITIVA

O instituto da prescrição surgiu da necessidade de controlar, através do tempo, o exercício de direitos, em prol da segurança jurídica e social.

Outrossim, além do elemento tempo, a prescrição está atrelada à inércia do titular de determinado direito.

Existem duas espécies de prescrição: (I) a “prescrição extintiva”, também chamada “prescrição liberatória”; e (II) a “prescrição aquisitiva”.

A prescrição “extintiva” (ou “liberatória”) é um fenômeno jurídico produzido pelo decurso do tempo e pela inércia do titular de um direito subjetivo patrimonial (aquele que confere ao seu titular uma pretensão de exigir de alguém um determinado comportamento com conteúdo econômico) que consiste na extinção de uma situação jurídica, paralisando a eficácia da pretensão do titular de um direito subjetivo. Em outras palavras, a prescrição é um fato jurídico que cria uma defesa destinada a neutralizar a eficácia da pretensão do credor (apenas neutralizar a eficácia da pretensão, e não extinguir a pretensão, tampouco seu respectivo direito subjetivo).

Já a prescrição “aquisitiva” é a aquisição do direito real pelo decurso do tempo (usucapião).

POSSE “AD USUCAPIONEM”

A posse que enseja a usucapião não é qualquer posse. Somente a posse “ad usucapionem” tem a usucapião como consequência. Posse “ad usucapionem” é aquela acobertada de características específicas necessárias à configuração da usucapião. É aquela que enseja a aquisição da propriedade por meio de usucapião[1]. É a posse revestida de características específicas que ensejam a aquisição da propriedade pela prescrição aquisitiva (usucapião), quais sejam:

  1. pública: a posse ad usucapionem há de ser pública (os atos por meio dos quais a posse se manifesta não são ocultos, secretos, clandestinos);
  2. contínua: a continuidade se verifica pela ausência de interrupção (Código Civil, arts. 1238 a 1240, 1242, 1260 e 1379);
  3. incontestada: sem oposição, passividade geral de terceiros;
  4. pacífica: não violenta ou, se maculada na sua origem pela violência, que essa tenha cessado (Código Civil, art. 1208);
  5. inequívoca: os fatos invocados pelo possuidor ressaltam de maneira clara, não duvidosa, que ele possuiu a coisa de maneira exclusiva, ousadamente e com autoridade e não a obteve de forma precária, ou seja, para mera detenção;
  6. “animus domini”: é a posse de quem tem a coisa como sua e se apresenta como se fosse dono, ou seja, com “animus domini”.

SENTENÇA QUE DECLARA A USUCAPIÃO É DECLARATÓRIA

Art. 1.241. Poderá o possuidor requerer ao juiz seja declarada adquirida, mediante usucapião, a propriedade imóvel.

Parágrafo único. A declaração obtida na forma deste artigo constituirá título hábil para o registro no Cartório de Registro de Imóveis.

A sentença que reconhece a usucapião é declaratória (não é constitutiva, não cria a usucapião, apenas declara sua existência como ocorrida, tanto que o usucapiente já pode arguir sua usucapião como matéria de defesa – Súmula 237 STF)

“ACESSIO TEMPORIS”

Art. 1.243. O possuidor pode, para o fim de contar o tempo exigido pelos artigos antecedentes, acrescentar à sua posse a dos seus antecessores (art. 1.207), contanto que todas sejam contínuas, pacíficas e, nos casos do art. 1.242, com justo título e de boa-fé.

CAUSAS QUE OBSTAM, SUSPENDEM OU INTERROMPEM A PRESCRIÇÃO AQUISITIVA

Art. 1.244. Estende-se ao possuidor o disposto quanto ao devedor acerca das causas que obstam, suspendem ou interrompem a prescrição, as quais também se aplicam à usucapião.

Aplicam-se as regras do CC quanto à impedimento, suspensão e interrupção da prescrição.

Ex: Estou na posse com animus domini. Se eu mandar um bilhete para o proprietário falando que devolverei, mas não devolvo, o bilhete vale para interromper a prescrição aquisitiva.

USUCAPIÃO COMO DEFESA (“EXCEÇÃO MATERIAL” OU “EXCEÇÃO SUBSTANCIAL”)

Súmula 237, STF – O usucapião pode ser arguido em defesa.

Como “exceção material”, a prescrição diz-se “exceção” porque pode ser utilizada como matéria de defesa em um processo, e diz-se “material”, pois é um instituto de Direito Material, que decorre da projeção de efeitos jurídicos pelo decurso do tempo.

De acordo com Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald[2], para obter proteção, o titular de um direito subjetivo que foi violado pode recorrer à tutela do Poder Judiciário, por intermédio de uma ação judicial, mas também pode ocorrer o contrário, isto é, o titular de um direito subjetivo patrimonial violado pode ser acionado judicialmente por outra pessoa, que alega ser o verdadeiro titular do referido direito. Isso é a “exceção substancial”, que consiste na alegação feita pelo titular de um direito, sob a forma de defesa em um processo ajuizado contra si para discutir exatamente esse direito, sendo, pois, defesa indireta contra uma pretensão ajuizada. É, portanto, a possibilidade reconhecida ao titular de um direito subjetivo de invocar a prescrição como exceção, em sede defensiva.

Os autores citam o seguinte exemplo[3]:

Há um exemplo bastante comum: imagine-se um proprietário que adquiriu o bem através de usucapião, possuindo como seu pelo tempo exigido por lei, nunca tendo ajuizado a ação de usucapião para obter o registro no Cartório de Imóveis, vem a ser demandado por terceiro que alega ser o legítimo titular. Poderá este titular se defender através de exceção, protegendo o seu legítimo direito subjetivo de propriedade. No campo dos direitos obrigacionais, podemos lembrar que o réu de uma ação de cobrança poderá invocar em seu favor, na sua defesa, que também é credor do autor da ação, por conta de uma outra dívida existente anteriormente, e que, por isso, pretende realizar uma compensação de valores. Nesse caso, a compensação também é apresentada como uma exceção – ou seja, é um direito subjetivo invocado pelo seu titular, que se encontra na posição de réu de um processo.

Notas:


[1] NERY JR., N.; NERY, R. M. D. A. Código Civil Comentado. 1ª edição em e-book baseada na 11ª edição impressa. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 1976.

[2] Direito Civil: Teoria Geral. 9. ed. Editora Lumen Juris: Rio de Janeiro, 2011, p. 812.

[3] Idem, Ibidem, p. 812/813.




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